O conhecimento da Pedagogia Sistêmica na formação de professores do ensino especial
Minha atuação em cursos
Há muitos anos venho trabalhando com cursos de formação para professores da Educação Especial e nestes cursos minha atuação sempre esteve voltada para teoria e prática envolvendo movimentos que pudessem trabalhar os profissionais em um âmbito maior de reflexão. Mesmo com o pouco conhecimento relacionado ao trabalho sistêmico fenomenológico de Bert Hellinger, parece que esta postura vai tomando conta do nosso interior e nosso olhar sistêmico vai ficando cada vez mais intenso, passando a atuar com ela em todos os momentos. Humildemente vou relatar alguns momentos onde o olhar sistêmico foi fundamental para desenvolvimento do curso.
Aula dos nomes
Nesta aula falamos da importância do ensino do nome próprio para as crianças, desde a educação infantil. Sempre inicio fazendo uma dinâmica para que os professores relacionem a teoria com a prática. Recortei em papel colorido uma camisa, do lado direito com manga e do lado esquerdo sem manga, entreguei a todos os participantes. Acharam estranha a diferença na manga, mas disse a todos que tinha um objetivo. Pedi que escrevessem em letra de forma o nome deles na parte inferior da camisa, e desenhassem no meio da camisa eles próprios, em seguida falamos sobre a importância do nome e a história de cada nome, depois pedi que escrevessem no lado direito da camisa, com manga, o nome do papai (representando o masculino) e no lado esquerdo, sem manga, o nome da mamãe (representando o feminino). Logo depois pedi que fechassem os olhos e visualizassem o papai e a mamãe atrás deles. Alguns disseram que o pai já havia morrido e disse para visualizar assim mesmo, pois continuava sendo o pai. Depois falamos que a força dos filhos está nos pais, que só podemos estar hoje juntos aqui neste curso graças aos nossos pais que juntos nos deram a vida e também afirmamos que do jeito que eles são, exatamente assim, são os pais certos para nós. Fizemos a relação com os pais dos alunos e pedi que todos naquele momento olhassem para seus alunos. Quando olhamos para os alunos estamos também olhando para os pais dos alunos. Disse que devemos concordar com os pais dos nossos alunos do jeito que são. Claro que gerou alguma polêmica, e houve alguns que se colocaram resistentes, mas disse a todos que quando iniciei a aula olhei para todos com seus pais, concordando com cada um jeito que é, ou seja, concordando com a família de vocês do jeito que é.
Para Hellinger (2005), “Uma criança só pode estar bem consigo mesma quando toma seus pais. Toma, é o que eu disse. Isto é, que os tomo do jeito que são e os respeito do jeito que são, sem querer ou desejar algo diferente. Exatamente do jeito que são, eles são certos. Quem toma os pais dessa forma está em paz consigo mesmo, sente-se completo. Seus pais estão presentes dentro dele com toda a força. (p.137).” Em 2004, surge a associação de moradores de Embu Guaçu, buscando atender todas as demandas de moradia às famílias em faixa de vulnerabilidade social. Passando um tempo e com suas atividades paralisadas por falta de recursos e ainda de alguma forma levando assistência a população local.
Fizemos um mural com as camisas e ali ficou representado cada um de nós e nossa família. Depois prosseguimos com o conteúdo dos nomes próprios. Aquele momento produziu um efeito maravilhoso em cada um, bastava olhar no semblante das pessoas. A força dos nossos pais atuando conosco durante todo o curso e por toda nossa vida.
Planejamento
Uma das aulas foi dedicada ao planejamento. Como já vinha observando que muitos dos professores do curso tinham dificuldade ou resistência a planejar e outros não sabiam como fazer o planejamento e alguns até achavam desnecessário, atuei com um exercício que ajudaria na mudança de postura relacionada ao tema.
Quase no final das atividades fiz a proposta ao grupo para que fizéssemos um exercício.
– “Escolham um colega e fiquem em duplas. Agora vocês vão olhar para este colega e se concentrar”.
Muitos estavam sorrindo quando olhavam para o colega. Pedi que olhassem nos olhos do colega e escolhessem quem seria o professor.
Alguns perguntaram: – “O outro será o aluno?”. Respondi que não estaríamos trabalhando com alunos naquele momento e que um seria o professor e o papel do outro eu só esclareceria ao final do exercício. Depois que escolheram pedi que deixassem o olhar do outro atuar e que não deveriam conversar, relaxassem as mãos e que eu iria falar algumas frases para que o professor repetisse.
Para o professor: – “Eu não gosto de trabalhar com você”. “Eu tenho resistência em trabalhar com você”. “Você é desnecessário”. “Eu não sei e não quero trabalhar com você”. “Eu não concordo com você e nem com o que vem antes de você”.
Logo em seguida pedi para que prestassem atenção no que estavam sentindo no corpo e alguns disseram que estavam se sentindo mal com o que o professor disse, outros continuavam sorrindo e diziam não sentir nada, outros diziam estar tristes como se quisessem sair daquele lugar.
Disse então a todos que iríamos refazer as frases, que se concentrassem novamente, que eles observassem o corpo e se ao final das frases sentissem vontade de fazer algum movimento, poderiam fazê-lo.
Disse então para o professor repetir: – “Eu gosto de trabalhar com você”. “É gratificante trabalhar com você”. “Você é necessário, minha resistência acabou”. “Eu quero aprender a trabalhar com você”. “Eu concordo com você e com o que vem antes de você do jeito que é”.
Em seguida, orientei a eles que poderiam fazer o movimento que sentiam vontade: alguns puxaram o professor, outros se abraçaram, outros choraram. Em outros casos era o professor que puxava o outro representante e alguns continuaram sorrindo. Depois trocamos os papéis para que todos tivessem a oportunidade de ser o professor e o outro representante. Após o exercício, revelei a todos que o outro representante era o planejamento, e que eles tiveram a oportunidade de perceber onde estão as dificuldades. Disse a todos também que o planejamento estava ali, ele queria que os professores trabalhassem com ele, respeitando aquilo que se passou e concordando do jeito que as coisas eram, para que as mudanças pudessem acontecer. À frente do planejamento sempre haverá alguém. Sendo assim, que observassem se as dificuldades não estavam relacionadas a esta pessoa, (coordenador, aluno, colegas de trabalho, direção) e não ao planejamento em si.
Alguns alunos do curso relataram o que sentiram:
– “Quando o professor parou de falar fiquei emocionada e quis puxá-lo para mim”;
– “Quando eu terminei minha fala a vontade era de pegar o planejamento para fazer algo, parecia que ele me pedia isso, mas não sabia que o representante era o planejamento”.
– “Foi estranho, mas o meu olhar enquanto planejamento estava apaixonado pelo professor”.
– “Eu só queria rir e não consegui sentir nada”.
Estes relatos foram os que ficaram registrados. Pedi a todos que sentissem o que aconteceu com cada um, não precisavam mais relatar, mas que deveriam buscar perceber como lá no fundo aquela vivência poderia ajudá-los no trabalho…
Aquele momento foi muito importante para a continuidade do curso e para a atuação dos professores no próximo planejamento. Pude observar no decorrer do ano uma grande melhora em relação ao planejamento. Reconheço que os ensinamentos de Bert Hellinger nos abrem muitas oportunidades, quando estamos conectados a ele. Humildemente agradeço.
Hellen Vieira da Fonseca-Taguatinga-DF/2016
Referência Bibliográfica:
HELLINGER, Bert. A fonte não precisa perguntar pelo caminho. – Patos de Minas, MG: editora Atman, p.137, 2005.