O PAI: Uma prosa da professora com o coração
Professora, hoje é Dia dos Pais?
Sim, coração.
Você preparou alguma homenagem para ele?
Eu já represento essa homenagem, coração.
Como assim, professora?
É simples! A minha alegria, o meu amor em servir e seguir entregando o que recebo honra a vida que recebi dos meus pais. E em cada passo ele transborda em mim. Vibra em mim.
Professora, já faz tempo que ele morreu. Como ele vibra?
São 19 anos sem a presença física do meu pai. E ele continua vibrando em cada célula do meu corpo. Apenas uma saudade gostosa que deixo fluir sentindo e respirando.
Explique melhor professora.
Eu respiro consciente do amor dele em cada célula e sinto a força dessa vibração que me atravessa.
Professora, conta isso melhor! Como atravessa?
É simples, coração. Em cada célula do meu corpo eu sinto vibrar o meu pai. Ele me atravessa de muitas formas. Eu sou ele! Eu sou a minha mãe!
E quando você sente isso, a saudade diminui?
Quando eu respiro esse amor que está nas minhas células, meu coração transborda… imediatamente a alegria que envolvia meu pai chega e as brincadeiras que ele fazia ficam latentes… Eu não resisto! Fico a própria filha do senhor Joaquim.
É mesmo, professora. Parece que ele era bem divertido.
Sim, coração. Divertido e firme! O PAI!
Como assim firme? Ele era bravo?
Ele não dava moleza. Me ensinou a ir para o mundo desde pequena. Na adolescência eu ficava chateada com as broncas e o posicionamento dele, pois ele segurava o meu impulso. Hoje olho para tudo que vivi e consigo perceber em detalhes o movimento do meu pai abrindo as portas do novo e dizendo: segue!
Verdade, professora! Abre uma dessas portas aí e conte! Conte!
Rsrsrs… vou contar apenas uma…
Jamais esquecerei o dia em que estava marcado para assinar o contrato como professora na SEE. Era um novo emprego, eu tinha apenas 18 anos. E para assinar o contrato eu precisava ir a três lugares diferentes e não sabia como chegar a nenhum deles. Pedi ao meu pai para me levar e ele respondeu: “Pegue o ônibus e vá. Agora você vai iniciar uma nova jornada e precisa aprender a se virar. Você é livre para errar e acertar.”
Nossa! E o que você fez?
Eu me virei. Naquele momento fiquei emburrada e com um grande bico. Hoje fica bem claro que ele acreditava que eu dava conta. Ele ficou de longe só observando o desenrolar dos meus passos e, claro, rindo muito do meu bicão (emburrada). Ele me mostrou o quanto eu era capaz. Acompanhou-me amorosamente e abriu espaço para que eu experimentasse aquele momento. E deu tudo certo! E essa experiência ressoa até hoje. O meu pai é o meu recurso e inspiração quando viajo sozinha para uma cidade nova, outro país, lugares que não conheço. Converso com o meu coração sentindo o meu pai e sempre a segurança em seguir se apresenta. É uma conexão imediata. Sei até o que ele diria se eu tivesse dúvida em seguir.
Interessante, professora! Quer dizer que o pai é uma força que empurra para frente?
Sim! O pai tem um movimento lindo na nossa vida. Ele representa o mundo, o trabalho, a segurança. Uma conexão de amor inexplicável. Mesmo que sinta insegurança, dúvida, sei que elas fazem parte. Deixar que o filho experimente e viva a experiência, mesmo que sinta que vai fracassar, é a grandeza do pai. Deixar fluir esse amor, com as costas quentes do pai, conecta-nos com a confiança, e a segurança nos atravessa.
Ai, professora! Estou emocionado com tudo isso… Você tem algo para falar aos pais nesse momento?
Vou falar para os filhos. Certo?
Então fala professora. Sou um coração curioso!
Rsrsrsr (risos)… às vezes não percebemos o quanto é forte a presença de um pai em nossas vidas e ficamos limitados nessa relação com as reclamações, os julgamentos e querendo que o nosso pai mude. Esse movimento nos afasta dele e ficamos mais fracos. Bloqueamos o fluxo amoroso dessa relação.
Olhar para o pai e agradecer a vida já é tudo. Ele estando presente fisicamente ou não, a vida continua vibrando em nós. E não importa se são perfeitos ou não, eles existem em nós do jeito que são. Com o pai fluindo através desse fio invisível que nos conecta, seguimos com confiança e ganhamos a confiança do outro.
Nossa professora, que força tem o pai… Estou transbordando. E para aqueles que ainda não conseguem fazer esse movimento, tem alguma dica?
Sugiro uma imagem:
– Imagine que antes de todas reclamações e julgamentos que temos com relação a nossos pais, já existia um amor incondicional deles por nós. Esse amor inicia com a vida e vem bem de longe… Ao se conectar com esse amor através do fio invisível, o essencial pode chegar. Experimente! Apenas se exponha a esse amor. E quem sabe no tempo certo algo se mostre.
Professora, isso é vida!
Sim, coração! Eu sou o meu pai! Eu represento a vida que veio dele e da minha mãe.
Gratidão, professora.
Gratidão, coração!
Hellen Vieira da Fonseca, 2017.